Tratamento de dependentes químicos: mais um retrocesso do governo Bolsonaro
Governo contraria especialistas e aumenta o repasse de dinheiro público para comunidades terapêuticas.
26 abr 2019, 18:48 Tempo de leitura: 1 minuto, 57 segundosÉ preocupante a política pública adotada pelo governo Bolsonaro para a questão da dependência química. Sem abrir licitação, o ministro da Cidadania Osmar Terra anunciou o repasse de R$ 153,7 milhões para 216 comunidades terapêuticas, que alegam tratar dependentes químicos.
Há uma série de problemas nessa decisão. O primeiro deles é a falta de dados que justifiquem essa política. O governo censura a divulgação do resultado de uma pesquisa feita pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) sobre o uso de drogas.
Intitulado 3º Levantamento Nacional Domiciliar sobre o Uso de Drogas, o estudo revela o oposto do que o governo Bolsonaro quer mostrar: não há epidemia de craque no Brasil. O jornal The Intercept teve acesso ao levantamento.
De acordo com o estudo, “0,9% da população usou crack alguma vez na vida, 0,3% fez uso no último ano e apenas 0,1% nos últimos 30 dias. No mesmo período, maconha, a droga ilícita mais consumida, foi usada por 1,5%, e a cocaína, por 0,3% dos brasileiros.” Uma equipe de 400 técnicos da Fiocruz entrevistou mais de 16 mil pessoas em 351 cidades brasileiras e seguiu todos os parâmetros indicados pelo IBGE.
É claro que esses resultados merecem preocupação e políticas adequadas, mas estão longe de ser uma epidemia, como propaga o ministro Osmar Terra. E o fato de Bolsonaro barrar a divulgação dessa pesquisa só nos leva a crer que o principal objetivo é justificar o repasse milionário.
O outro grave problema dessa política é que as tais comunidades terapêuticas são entidades privadas e, na maioria das vezes, ligadas a igrejas. Elas propõem abstinência, restrição do convívio social e isolamento. Só que a lei nº 10.216/2001 determina que a internação só é indicada quando os recursos extra-hospitalares não estão atingindo resultados, portanto, em casos muito graves.
Além disso, 28 dessas comunidades foram fiscalizadas e todas violavam os direitos humanos e desrespeitavam a liberdade religiosa, sexual e a identidade de gênero.
É um absurdo que o governo trate a questão da dependência química de forma tão irresponsável. Trazer à tona esses tratamentos em comunidades terapêuticas é dar muito passos para trás, voltar à lógica dos manicômios, violar os direitos humanos e aumentar o encarceramento de uma população que já está vulnerável.