Ministro da Educação faz pronunciamento pedindo a volta às aulas, mas não oferece condições para retorno seguro
Milton Ribeiro não demonstrou preocupação com as condições sanitárias das escolas, com a reposição do conteúdo ou com a vacinação da comunidade escolar
21 jul 2021, 17:29 Tempo de leitura: 12 minutos, 6 segundosNa noite de terça-feira (20), o ministro da Educação fez um pronunciamento em rede nacional pedindo o retorno às aulas. Em um pouco mais de 5 minutos, Milton Ribeiro usou o espaço para pressionar governadores e espalhou desinformação sobre a volta dos profissionais de educação e estudantes para as escolas. Dentre tantas mentiras, o ministro comparou países que começaram a vacinação em dezembro de 2020 com o Brasil, que tem menos de 17% da população imunizada contra a doença.
A deputada Sâmia Bomfim, membro da Comissão de Educação da Câmara Federal e presidente (afastada por conta da licença-maternidade) da Subcomissão Especial de Retorno Seguro às Aulas, afirma que o governo de Jair Bolsonaro, desde o início da pandemia do novo coronavírus, fez uma péssima gestão junto aos estados e municípios no enfrentamento à Covid-19. “Milton Ribeiro desconsidera a diversidade brasileira e as desigualdades na vacinação, dentre tantos outros problemas ainda sem resolução para a volta às aulas com segurança”, disse Sâmia.
O ministro da Educação que, desde que assumiu o cargo, não estabeleceu diálogo algum sobre o tema com o Congresso Nacional, comunidade escolar e especialistas no tema, “convocou” alunos e profissionais da área para voltarem às aulas presenciais. Em pronunciamento, ele defendeu que manter escolas fechadas traz consequências “devastadoras”, impactando negativamente os mais jovens.
O primeiro grande impeditivo para volta às aulas neste momento é vacinação, que devido às tentativas de corrupção e o negacionismo do governo Bolsonaro, não começou no Brasil há mais tempo, pois foram negadas repetidas vezes a compra de imunizantes.
Outra preocupação é a estrutura física das escolas. “Os protocolos de biossegurança sanitários não estão sendo fiscalizados pelo governo federal e não foram feitas reformas estruturais básicas nos ambientes escolas. Como exemplo disso temos as salas de aula fechadas, sem ventilação e lotadas”, declarou Sâmia.
Lembramos também que, conforme amplamente divulgado, a variante Delta ameaça os mais jovens porque não se imunizaram e a Covid já é a maior causa de mortes por doença de pessoas entre 10 e 19 anos.
A deputada do PSOL/SP alerta que durante o pronunciamento do ministro da Educação não foi dita nenhuma palavra sobre a perspectiva de reposição do conteúdo escolar para os estudantes brasileiros. “A lógica do governo Bolsonaro é deixar os estudantes que têm menos condições e estrutura à própria sorte, perpetuando o abismo de oportunidades e acesso ao conhecimento entre os que mais precisam do Estado”.
Segundo levantamento feito pelo jornal O Estado de São Paulo, junto aos governos estaduais, Até aqui, 12 estados reabriram as escolas públicas após o período de quarentena exigido pelo cenário anterior de crescimento das infecções pelo coronavírus. Na rede privada, por outro lado, os alunos já foram liberados para voltar em pelo menos 22 estados e no Distrito Federal.
“Precisamos, minimamente, garantir a testagem continuada da comunidade escolar e o rastreamento dos possíveis casos de contaminação”, enfatiza a deputada federal que também disparou: “O apelo do ministro da educação é mais uma chantagem que tem como fundo de pano tirar a responsabilidade do governo Bolsonaro”.
Desigualdade no acesso à internet
Segundo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 4,3 milhões de estudantes brasileiros entraram na pandemia sem acesso à internet, seja por falta de dinheiro para contratar o serviço ou comprar um aparelho seja por indisponibilidade do serviço nas regiões onde viviam. A cobertura varia muito entre regiões, faixas de renda e tipo de escola frequentada.
Considerando apenas municípios da zona rural, por exemplo, a taxa de cobertura de internet é de 55,6% dos domicílios. No Norte do país, apenas 38,4% das residências da área rural tinham acesso à internet. No Nordeste, a taxa é de 51,9%.
Os dados são de abril de 2021 e reforçam a desigualdade no ensino a distância entre estudantes das redes pública e privada.
Em junho, o Congresso derrubou o veto do presidente Jair Bolsonaro a um projeto de lei que previa o repasse de cerca de R$ 3,5 bilhões da União para que estados melhorassem a internet e a conectividade de escolas públicas do ensino básico, durante a pandemia de Covid-19. Mas os repasses ainda não estão sendo feitos pelo Ministério da Educação.
Na ocasião da derrubada do veto, Sâmia declarou que mesmo diante da omissão do MEC, o Congresso havia aprovado o PL de Conectividade, que daria o direito ao acesso à internet para milhões de alunos. “O governo decidiu atrapalhar a vida dos estudantes brasileiros, mas nós derrubamos o veto de Bolsonaro ao projeto e agora a lei torna-se obrigatória”, disse a deputada.
A única iniciativa efetiva do MEC na educação básica foi o incremento, a partir de outubro, de cerca de R$ 600 milhões no programa que envia dinheiro para as escolas. No entanto, os gastos totais com esse programa, chamado Dinheiro Direto na Escola, em 2020 (de R$ 1,7 bilhão) são os menores ao menos desde 2015, na comparação com valores atualizados.
Gestão do ministro Milton Ribeiro
A gestão do atual ministro da Educação acumula erros em transferências de recursos e marcada pela redução de orçamento e pela ausência de medidas para o enfrentamento da pandemia da Covid-19. Secretários e especialistas cobram uma coordenação federal para garantir, entre outras coisas, conectividade para alunos e plataformas educacionais.
Em relatório da Comissão Externa de acompanhamento do Ministério da Educação (Comex/MEC), obtido com exclusividade pelo jornal O GLOBO, mostrou que, até 15 de junho, a pasta não havia pago um centavo sequer do R$ 1,2 bilhão disponível para infraestrutura da educação básica.
Subcomissão de retorno seguro às aulas está em funcionamento na Câmara dos Deputados
No dia 16 de abril de 2021, a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL/SP) foi eleita presidente da Subcomissão Especial de Retorno Seguro às Aulas no âmbito da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. O espaço temático foi criado exclusivamente para tratar da volta às aulas presenciais durante a pandemia da Covid-19.
Sâmia informou, durante os debates, que todos que acompanham a pauta sabem que a demora na volta às aulas presenciais implica em diversos problemas preocupantes. “Desde a possível piora na alimentação dos estudantes mais pobres, até sobrecarga de mães, pais ou tutores, em muitos casos impossibilitados de trabalhar em casa e de supervisionar as atividades dos filhos são contratempos reais”, alerta a parlamentar. Mas ela enfatiza que a volta às aulas presenciais não pode ser pensada de forma açodada, sem planejamento, como está sendo feito pelo governo Bolsonaro.
“Infelizmente, as nossas escolas no Brasil têm estruturas precárias, problema de ventilação e nem todos os participantes das comunidades escolares conseguem ter acesso materiais de proteção”, destacou na primeira reunião do colegiado.
Em diversos momentos, professores e especialistas em educação apresentaram dados que apontam para os riscos da volta às aulas sem a vacinação dos profissionais de educação em todo Brasil.
No dia 22 de abril, em reunião da Comissão, o professor Daniel Cara argumentou que é preciso garantir o retorno da comunidade escolar com qualidade e segurança. “Defendemos a educação presencial, defendemos uma escola com padrão de qualidade alta, uma escola que, inclusive, fique aberta aos finais de semana, para que os alunos tenham acesso às bibliotecas e ao espaço de lazer das escolas. Mas este retorno precisa acontecer com a maior segurança possível”, destacou.
Para o membro da REPU, Fernando Cássio, quando as pessoas falam em escola segura devemos materializar que risco é este. “Devemos exigir das autoridades que eles publiquem dados sobre a situação das redes de ensino em todo o Brasil, pois os dados primários não estão disponíveis para pesquisa”, alertou durante o debate.
Pedidos de informação às secretarias de Educação e Saúde
Sâmia Bomfim, enquanto presidente da Subcomissão, enviou pedidos de informação aos representantes das secretarias de Educação e Saúde de todos os estados brasileiros.
Aos representantes pela área da educação, a deputada questionou os seguintes pontos:
a) Há previsão para autorização de retorno das aulas presenciais nas instituições de ensino nos Municípios do Estado?
b) Caso já tenha ocorrido autorização de volta às aulas na modalidade presencial, em quais localidades e a partir de quais datas este retorno ocorreu?
c) Caso haja previsão de volta às aulas na modalidade presencial, para quais localidade e a partir de quais datas este retorno fica autorizado?
d) Qual o número total de servidores e profissionais de educação que prestam serviços nas instituições de ensino público, considerando vínculo trabalhista de qualquer natureza (v.g., estatutário, empregado celetista, terceirizado e outras categorias), que são ou podem ser impactados com o retorno às aulas na modalidade presencial?
e) Qual o número total de estudantes matriculados nas instituições de ensino público e privados que são ou podem ser impactados com o retorno às aulas na modalidade presencial?
f) Caso a volta às aulas na modalidade presencial tenha ocorrido, quais os protocolos de biossegurança desenvolvidos pelo Estado que orientam tal retorno? Qual a metodologia utilizada para a elaboração de tais protocolos de biossegurança?
g) Caso haja previsão de volta às aulas na modalidade presencial, quais os protocolos de biossegurança desenvolvidos pelo Estado que orientam tal retorno? Qual a metodologia utilizada para a elaboração de tais protocolos de biossegurança?
h) Eventual protocolo de biossegurança desenvolvido pelo Estado, que orienta o retorno às aulas, levou em consideração as condições específicas de cada instituição de ensino público e privado, tais como ventilação das salas de aulas e estrutura necessária para promoção do distanciamento dos estudantes, servidores e profissionais de educação?
i) Existe protocolo, plano ou programa de vacinação, em execução ou previsto, no âmbito Estadual, que contemple especificamente os servidores, empregados e trabalhadores da educação, das instituições de ensino público e privada? Em caso afirmativo, o protocolo, plano ou programa de vacinação deste grupo é de acesso universal ou prevê alguma condição para obtenção da vacina, tal como pertencimento a determinada faixa etária, existência de comorbidade e qualificação profissional?
j) Qual o número atualizado de óbitos de servidores, empregados e trabalhadores da educação, das instituições de ensino público e privada? Quais protocolos, diretrizes e procedimentos foram recomendados pela Secretaria de Estado da Educação e adotados por referidas instituições após o falecimento destas pessoas privado de todos os níveis de ensino, quais sejam: educação infantil, pré-escola, ensino fundamental, ensino médio, ensino médio técnico, ensino técnico, educação de jovens e adultos (EJA), educação no campo, educação especial e ensino superior (graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado):
Seguindo o mesmo instrumento legislativo, Sâmia requereu às secretarias de Saúde:
a) Existe protocolo, plano ou programa de vacinação, em execução ou previsto, no âmbito Estadual, que contemple especificamente os servidores, empregados e trabalhadores da educação, das instituições de ensino público e privada, quais sejam: educação infantil, pré-escola, ensino fundamental, ensino médio, ensino médio técnico, ensino técnico, educação de jovens e adultos (EJA), educação no campo, educação especial e ensino superior (graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado)?
b) Existindo protocolo, plano ou programa de vacinação, em execução ou previsto, que contemple especificamente os servidores, empregados e trabalhadores da educação, conforme referido na questão “a)” acima, a vacinação deste grupo ocorre na modalidade de acesso universal à vacina ou em modalidade que prevê alguma condição para obtenção da vacina, tal como pertencimento a determinada faixa etária, existência de comorbidade e qualificação profissional?
c) Qual o número atualizado de óbitos de servidores, empregados e trabalhadores da educação, das instituições de ensino público e privada? Quais protocolos, diretrizes e procedimentos foram recomendados pela Secretaria de Estado da Saúde e adotados por referidas instituições após o falecimento destas pessoas?
d) Caso a volta às aulas na modalidade presencial tenha ocorrido, quais os protocolos de biossegurança desenvolvidos pela Secretaria de Estado da Saúde que orientam tal retorno? Qual a metodologia utilizada para a elaboração de tais protocolos de biossegurança?
e) Caso haja previsão de volta às aulas na modalidade presencial, quais os protocolos de biossegurança desenvolvidos pela Secretaria de Estado da Saúde que orientam tal retorno? Qual a metodologia utilizada para a elaboração de tais protocolos de biossegurança?
f) Eventual protocolo de biossegurança desenvolvido pela Secretaria de Estado da Saúde, que orienta o retorno às aulas, levou em consideração as condições específicas de cada instituição de ensino público e privado, tais como ventilação das salas de aulas e estrutura necessária para promoção do distanciamento dos estudantes, servidores e profissionais de educação?
Os órgãos estaduais deviriam apresentar resposta aos requerimentos ofício, no prazo de 15 (quinze) dias. Até o momento, diversos estados não deram retorno à Subcomissão.
Veja aqui os principais questionamentos apontados por Sâmia Bomfim:
– MEC não ouviu especialistas em educação, infectologia ou as comunidades escolares;
– Não foram feitas reformas estruturais garantindo maior ventilação e menor contato entre os estudantes;
– Calendário de imunização atrasado em diversos estados;
– Vacinação dos profissionais de educação não aconteceu de maneira massiva;
– Não existe uma política de testagem e rastreamento;
– Transparência de quais são as condições das escolas + qual a porcentagem de trabalhadores já vacinados;
– Falta de investimento financeiro do MEC, que tinha 1,2 bi à disposição para organizar e estruturar a volta às aulas e não executou nada do orçamento.