Sâmia apresenta PL que estabelece marco legal para orientar o registro de crianças provenientes de inseminação artificial heteróloga
Projeto nº 1902 terá impacto positivo para famílias compostas por casais de mulheres que desejam realizar procedimento por meio de material genético de um doador (inseminação caseira)
27 jul 2022, 17:31 Tempo de leitura: 3 minutos, 59 segundosNo final do mês de junho de 2022, alguns dias antes do encerramento do semestre legislativo, a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL/SP) apresentou o Projeto de Lei nº 1902 (LEIA AQUI), que estabelece marco legal de orientação ao registro de crianças provenientes de inseminação artificial heteróloga (realizada com material genético de um doador) independentemente da forma e local em que ocorreu a inseminação ou de prévia autorização judicial.
A data do protocolo aconteceu em consideração ao marco internacional de junho como o Mês do Orgulho LGBTQIA+, tendo em vista o impacto da proposição sobre as famílias composta por casais de mulheres.
Sâmia informa que atualmente não existe legislação específica que regule a inseminação artificial e é sobre esta dimensão – do registro civil e suas decorrências – que e a proposição se direciona. “Hoje, o Estado usa como base a Resolução 2294/2021 do Conselho Federal de Medicina quando trata-se de normas éticas, exigências e procedimentos de ordem clínica que devem ser observadas por médicos e centros especializados de reprodução humana; e o Provimento 63 do Conselho Nacional de Justiça quanto às regras cartoriais para o registro de nascimento das crianças havidas por intermédio destas técnicas, de observância dos ofícios de registro civil”, destaca a autora do PL.
A proposição busca preencher uma lacuna legal que, atualmente, dificulta o registro de crianças por casais que realizam procedimentos de inseminação artificial fora de clínicas e centros especializados em reprodução humana, que em geral são acessíveis apenas a pessoas com alto poder aquisitivo. Para estes casos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) prevê, em seu provimento, os requisitos para o registro dos recém-nascidos, dentre os quais a apresentação de declaração assinada pelo diretor técnico da clínica. Já para os casos de inseminação artificial realizados fora de clínicas especializadas – amplamente conhecidos como procedimentos de “inseminação caseira” –, apesar de perfeitamente regulares e não proibidos pela legislação, impera a omissão e a informalidade, cujos efeitos são percebidos no momento do registro da criança nos cartórios de registro civil.
A deputada chama a atenção para o fato de apesar do vácuo na legislação brasileira nada impede que estes procedimentos sejam largamente negociados nos fóruns de redes sociais e geralmente são realizados por casais com problemas de fertilidade masculina, casais homoafetivos de mulheres, mulheres que almejam uma gestação independente e homens interessados em disponibilizar seu sêmen para reprodução, interagem e viabilizam os procedimentos entre si, feitos em geral com a introdução do material genético do doador diretamente na vagina da futura gestante por meio de seringas descartáveis.
“É bem comum localizar nas redes sociais grupos e comunidades cujo foco é viabilizar o contato de casais e mulheres com doadores de sêmen”.
Sâmia lembra que as pessoas tratam o procedimento de reprodução humana caseiro sem muitas dificuldades de realização, principalmente, pelo motivo de não incidir qualquer tipo de limitação de ordem econômica, sendo, por esta razão, amplamente difundido entre diversos grupos de pessoas, como os citados acima.
Também por falta de regulamentação, cartórios de registro civil comumente opõem obstáculos no assento de nascimento de crianças havidas por inseminação caseira, especialmente quando provém de casais de mulheres. Isso ocorre porque além de não possuírem os documentos exigidos pelo CNJ para registro de inseminação artificial assistida por médicos – única regulação existente sobre a matéria –, no registro de criança por duas mulheres não é possível pressupor tratar-se de filho biológico de ambas. No caso de casais heterossexuais, por sua vez, há o benefício do silêncio: se não expõem qual o método reprodutivo utilizado, presume-se tratar de filho biológico do casal, e seu registro será feito sem maiores dificuldades.
“Apesar da legislação determinar formalmente a não discriminação por orientação sexual na realização dos registros públicos, a ausência de regulamentação da inseminação caseira gera, objetivamente, uma discriminação no registro dos filhos por casais de mulheres, implicando na exclusão do registro da mãe não gestante na certidão de nascimento”, denuncia Sâmia.
Para lidar com esta disparidade, que gera discriminação, o PL 1902/2022 busca estabelecer um marco legal mínimo que assegure o pleno direito ao registro civil das crianças geradas por inseminação artificial, com o reconhecimento da parentalidade e os efeitos jurídicos dela decorrentes.