Comunidades terapêuticas: parlamentares do PSOL querem suspender portaria do MDS que afrouxa fiscalização
A possibilidade de fiscalização remota, da terceirização do monitoramento e de até cinco dias úteis para o relatório de denúncias graves são os pontos mais críticos, alertam deputados
29 nov 2023, 20:42 Tempo de leitura: 3 minutos, 24 segundosCom informações da Revista Fórum
Os mandatos de Sâmia Bomfim (PSOL-SP), Fernanda Melchionna (PSOL-RS) e Glauber Braga (PSOL-RJ) apresentaram, na Câmara, um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que visa sustar a Portaria nº 926, publicada pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) em 20 de outubro. Segundo os parlamentares, a medida “afrouxa” as regras de fiscalização das chamadas “comunidades terapêuticas” (CTs).
O PDL 420/2023 visa suspender os efeitos da Portaria que estabelece diretrizes em âmbito nacional para a fiscalização e monitoramento dos serviços prestados por entidades de apoio e acolhimento atuantes em álcool e drogas do MDS. Para os deputados, os pontos mais críticos dizem respeito à fiscalização dessas comunidades, tendo em vista que o texto editado pela pasta permite que o procedimento seja feita “por terceiros” e de “modo remoto”.
“É evidente que há necessidade de fiscalização dessas instituições; todavia, há de ser questionado o método proposto pelo MDS. Até o momento, o documento utilizado para a fiscalização das CTs é uma normativa da Vigilância Sanitária, qual seja, a RDC n° 29, de junho de 2011. Apesar dessa normativa apresentar lacunas, em nenhum momento o texto da RDC cita fiscalização realizada por contratação de terceiros, com a possibilidade de ser realizada de forma remota e com prazo de dez dias, que pode ser diminuído para 5 dias para o envio de documentação em casos que envolvam denúncias de graves irregularidades”, diz um trecho do projeto.
Além disso, os parlamentares questionam o prazo de cinco dias úteis para o envio dos relatórios de fiscalização com relatos de casos graves de infrações à Lei da Reforma Psiquiátrica e aos direitos humanos. “Se a fiscalização encontra violações, por exemplo, tortura ou fome, em nosso entendimento, o prazo máximo de resposta deveria ser de até 72 horas, tendo como referência o prazo estabelecido na Lei 10.216/2001, que fixa esse limite de tempo para que os hospitais psiquiátricos comuniquem a internação involuntária ao Ministério Público Estadual”, afirmam no documento.
Para Glauber, “os milhões de reais colocados nas comunidades terapêuticas deveriam estar sendo utilizados para fortalecer a Rede de Atenção Psicossocial”. “Além disso, é inconcebível que a fiscalização seja realizada pelo setor privado ou terceirizadas que não terão o compromisso público de acompanhamento. O nosso PDL visa minimizar essa situação preocupante”, completou o deputado.
Já Fernanda afirma que, conforme relatado na íntegra do PDL, há “graves denúncias de abusos e crimes que ocorrem dentro das “comunidades terapêuticas”: “Diante de um quadro histórico de maus-tratos, é inadmissível que a fiscalização seja afrouxada. É absurdo permitir que ela seja feita de forma remota, como autoriza a portaria, o que certamente aumentará a negligência”.
Histórico
Em fevereiro, Sâmia e outro colega de bancada, Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), encabeçaram o PDL 34/2023, com o intuito de sustar a criação do Departamento de Apoio a Comunidades Terapêuticas como parte da estrutura MDS. Em março, eles estiveram reunidos com a diretora do Departamento de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Sônia Barros, para relatar a preocupação com o crescimento das CTs pelo Brasil.
As comunidades terapêuticas, em grande maioria, são entidades de caráter privado e filantrópico, de natureza religiosa fundamentalista e que não seguem protocolos conquistados pela luta antimanicomial. Durante o governo Bolsonaro, foram criadas cerca de 5 mil unidades em todo o país, gerando um custo de quase R$ 1 bilhão à União. No início de 2023, a previsão de gastos para o ano foi de R$ 215 milhões.
Já no fim do primeiro semestre, o governo Lula cedeu à pressão e anunciou a descontinuidade do setor no MDS, renomeando para Departamento de Entidades de Apoio e Acolhimento Atuantes em Álcool e Drogas. Mas, na prática, a política de fomento desses estabelecimentos segue mantida pelo Ministério, atendendo ao lobby religioso.