Quem tem medo da liberdade de expressão?
Em busca de nova identidade, MBL e Vem Pra Rua distorcem a realidade no sentido de impor uma lógica de censura e perseguição ao que diverge das suas ideias.
(Por Samia Bomfim. Artigo originalmente publicado em sua coluna no HuffPost Brasil, dia 02/12/2017)
A conjuntura inóspita de crise política e econômica tem dado abertura para a expressão do que há de mais retrógrado na sociedade. Não à toa que movimentos como MBL e Vem para Rua encontraram formas de se organizarem e fortalecerem frente à desesperança da população com o sistema político vigente.
Vendem-se como a renovação necessária, contudo, essa apresentação só se sustenta até a primeira página, uma vez que tais agrupamentos seguem defendendo o governo de Michel Temer, titubeiam em suas posições sobre corrupção, além de defenderem a retirada sucessiva de direitos que, hoje, conforma-se no Brasil. Estão cada vez mais expostas as relações que mantêm com o que há de mais atrasado na política.
Os episódios recentes envolvendo o Queermuseu (PoA e RJ), MAM, Masp e Sesc Pompeia são a prova da perda de moral desses movimentos, que deixaram de combater a corrupção e de defender a suposta "ética" na política após seus aliados, padrinhos políticos e patrocinadores serem flagrados em escândalos de corrupção.
Assim, na tentativa de encontrarem uma "nova identidade", distorcem a realidade no sentido de impor uma lógica de censura e perseguição a tudo aquilo que diverge das suas ideias, principalmente quando se trata de questões fundamentais para os setores oprimidos.
Não há dúvidas de que seus alvos não são aleatórios. As conquistas sociais nos últimos anos, marcadas sobretudo pela luta das mulheres, LGBTs, negras e negros, representam o fortalecimento de um mundo no qual o conservadorismo não terá voz.
Eles, então, reagem. Oportunisticamente, lançam uma cortina de fumaça sobre pautas comprometedoras aos seus projetos e criam factoides com o intuito de incentivar um discurso de ódio. Infelizmente, como a arte e a cultura pouco são tratadas como direito em nosso país, e o ensino de gênero, por exemplo, não está nos currículos escolares, essas expressões reacionárias encontram aderência.
É importante lembrar que estes mesmos setores defendem ferrenhamente o projeto 'Escola sem Partido', isto é, propõem uma escola que não desperte o pensamento crítico, que não tolere as divergências e não se paute pelo respeito à diversidade. Embora consiga ser aprovado em algumas câmaras municipais no interior do Estado, é sempre barrado nas instâncias jurídicas por ser expressamente inconstitucional.
O discurso conservador sempre esteve presente. A diferença é que, hoje, são confortavelmente expressados nas ruas e nas redes. Afinal, os reacionários precisam reagir ao amplo levante dos oprimidos que tem marcado os movimentos sociais nos últimos anos.
No caso do Masp, reverteu-se a restrição etária da exposição "História da Sexualidade". A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público divulgou uma nota técnica sobre liberdade artística e proteção de crianças e adolescentes, afirmando que não cabe ao Estado limitar o acesso de crianças e adolescentes a esses eventos, ainda mais quando acompanhadas por algum responsável.
Assim, não havia sentido em se aplicar uma restrição ao museu. Além disso, o documento é incisivo ao tratar da liberdade artística, utilizando como exemplo diversos casos em que obras, hoje consideradas clássicas, foram fortemente repudiadas no seu tempo.
No Sesc Pompeia, nós éramos maiores que eles. Judith Butler realizou sua palestra sobre democracia. Depois, foi covardemente agredida no aeroporto, em cenas que envergonham internacionalmente nosso país.
Assim, devemos seguir resistindo nas ruas e ocupando a política. Nesse sentido, os atos vitoriosos que ocorreram contra a PEC 181 nos mostram o caminho!